29 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Margens de Condão




Enorme este desejo de naufragar
No plenilúnio alvo de marés transcendentais

Escuto o chamamento deste rio transbordante
Reflecte das tuas pupilas a vontade de ficar
Vogando nestas margens ocidentais
Desabridas, onde apenas o teu eco me clama
Condão que sereno me desarma…



© Luís Monteiro da Cunha

28 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Anuncio da embaixada do Canadá

Na mesma página, (referida no post anterior) e no terço inferior direito… pasmei, fiquei estupefacto, triste e enxovalhado na minha condição de cidadão português ordeiro e semi-culto, ao ler o anúncio ali colocado pela embaixada do Canadá pedindo a atenção de todos os cidadãos canadianos residentes ou turistas em Portugal:

O governo do Canadá informa os seus cidadãos que se devem inscrever na Embaixada do Canadá a fim de poderem ser contactados em caso de

SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA


Segue-se a mesma mensagem na língua de Churchill e outra na língua de De Gaulle, terminando com a morada e telefones da referida embaixada em Lisboa e do endereço na Internet http://www.voyage.gc.ca

Mas que é isto?!
Por acaso pensa o governo canadiano que Portugal e os portugueses são tão bárbaros e estúpidos, arrogantes e hipócritas, como aquele governo?
Será Portugal e seus residentes, algum país sem leis e xenófobo ao ponto de perseguir, como eles o fazem, os cidadãos canadianos residentes ou turistas em Portugal? Ou pensarão que executamos a lei de Salomão, “ olho por olho, dente por dente “?
Era o que mereciam, mas não somos tão analfabetos como nos querem fazer crer aos olhos do mundo. Somos até permissivos demais e com prejuízo próprio.
Não executamos as mesmas medidas unilaterais e retrógradas que os move. Seja na expulsão da mão-de-obra barata que exploraram até à exaustão e que neste momento recessivo querem e estão a remeter aos países de origem, escudando-se em desculpas esfarrapadas aos olhos de todos. Só lhes fica mal, constatarem que só após vários anos de permanência, ilegal é certo, mas no entanto por si permitida porque necessárias, afinal existem ilegais demais e os seus empregos já são necessários para os seus súbditos.
Porque não foram expulsos gradualmente e na devida altura, antes de criarem raízes e já com descendência naturalizada naquele país? Será que os seus serviços de registo de cidadãos ainda trabalha pior do que os nossos (dos quais dizemos tão mal) e não repararam que os pais dessas crianças eram emigrantes ilegais, ou só agora é que viram esse problema da ilegalidade?

Voltando ao anuncio, temerá o governo do Canadá que estes bárbaros e incultos portugueses, desatem à paulada aos seus súbditos, como o fazem eles ainda hoje, por ordem expressa do dito governo culto, sobre as indefesas focas bebés, mutilando-as e deixando-as a agonizar até à morte, tendo o devido cuidado para não estragar a pele (sempre darão uns trocados, e rentabiliza-se a campanha!) triste governo este, que permite esta barbárie apenas por motivos económicos e pesqueiros.
Esquece-se o peticionário do anúncio que o Canadá, exceptuando algumas tribos autóctones que existiam à data da sua criação como nação, não existiria hoje sem os braços e mentes dos emigrantes que voluntariamente, ou não, ali se exilaram e o fizeram crescer até hoje… para quê? Para isto que se vê e lê todos os dias?


VIVA PORTUGAL!
Por estas e outras,
ORGULHO-ME DE SER PORTUGUÊS!
Apesar de inculto e caduco… mas humano racional!

O meu abraço Português a todos os cidadãos canadianos, e especialmente aos portugueses ali radicados, nesta hora tão triste para a nossa comunidade.

© Luís Monteiro da Cunha

Luís Monteiro da Cunha

ECLIPSE SOLAR

Imagem daqui


Pois lendo, (este hábito…) o jornal diário… penso que já sabem qual… O JN claro, deparo-me com a página vinte e um e o tema da página: Sociedade e Vida.

Anuncia um eclipse solar parcial que será visível em Portugal, amanhã a partir das 10 horas até cerca do meio-dia.
Terá uma obscuridade de 22%, mas sempre dará, com as devidas protecções oculares, claro, para levantar o nariz em direcção do astro rei e sentir escurecer o dia, apesar de pouco, portanto não se assustem.
Também pode ser visto na sua totalidade, mas apenas através da Internet, dado que o Centro de Astrofísica da Universidade do Porto, em colaboração com a NASA, transmitirá o evento a partir da Turquia e Líbia, onde o eclipse será total.
Do mal, o menos, sempre dará para tirar imagens espectaculares e seguir em directo o fenómeno…


Mas… há sempre um mas… leiam o post seguinte…

27 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Pautas da vida

Solitário


A espera é solitária
como solitárias são todas as esperas
as mãos contritas, perdem-se em abstractos
desenhos etéreos como batutas
cortam o ar, mas a orquestra não acompanha o movimento
A cidade não se compadece
e alheia, segue os acordes definidos
em cada banco de nevoeiro matinal…
São as pautas da vida




© Luís Monteiro da Cunha

25 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Chama indómita





O nosso olhar é carícia
Quando te beijo, somos paixão
È força, desejo, é codícia
Sempre que te vejo, é veneração!

Neste olhar consentido
Existe alma e prazer
De te sonhar embevecido
E sem falarmos saber
De chama é preenchido

E de ti satisfazer
A verdade alcançada
Num simples tender
De teus lábios a palavra

Do desejo profundo
Que emana do teu ser
Indómito de mulher
Que em mim se deu ao mundo


© Luís Monteiro Cunha

24 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Efemérides... JÚLIO VERNE

2006-03-24

Nem sempre consigo ter tempo!
Mas hoje de manhã, até “deu” para me sentar a saborear um café e percorrer avidamente as páginas do jornal diário que neste caso especifico é o “JN”.
Não dispenso o artigo de opinião dos seus colaboradores e jornalistas, especialmente (porque será?) a opinião do Manuel António Pina que diariamente “bota faladura” na última página do referido jornal.
Hoje divaga no tema da blogosfera e das visitas que não dispensa diariamente aos seus favoritos. Segundo escreveu, num dos blogs, foi acusado de nada perceber das “artes tauromáquicas”. Como é seu timbre respondeu objectivamente, confirmando a sua ignorância e quiçá até rejubilando-se com o facto.
Gostei de saber que afinal não sou apenas eu que desconheço em absoluto a dita “arte” que abomino.
Estou como tu, Manuel, “Viva esta ignorância voluntária”.

Mas o que me faz escrever estas singelas linhas nem sequer foi o facto tauromáquico do Manuel Pina.

No mesmo jornal, verifiquei na página das efemérides que neste dia faleceu Júlio Verne (1815-1905).
Este escritor, a par de Enid Blyton (1897-1968) e outros, povoaram e acompanharam a minha infância e juventude. Especialmente o Júlio Verne, que por recordar hoje nesta página de jornal, já sou de novo assaltado pelas imagens que me sugestionou à mais de trinta anos em livros como “ As vinte mil léguas submarinas ” que acho ser, ainda hoje, um dos livros mais futuristas, mas exacto no avanço da ciência e da modernidade comprovada pelo tempo; “ Viagem ao centro da terra “; “ Cinco semanas em balão “ e outras dezenas de publicações a que tive o privilégio de colocar as mãos e que sempre me aguçaram e preencheram a imaginação.

Desejo apenas agradecer, espiritualmente falando, a esta mente visionária mas rica em detalhes, as visões que me proporcionou e continua a proporcionar aos nossos jovens, educando e abrindo novos horizontes, ajudando a assimilar e aceitar contextos díspares na realidade actual, mas conseguindo que se abra a mente a novos caminhos, mesmo que pareçam impossíveis hoje ainda, de se concretizarem nos dias que vivemos.

Mas quem poderia afirmar com convicção, à vinte e cinco ou trinta anos atrás, que seria possível telefonar sem fios ou mudar o canal da TV sem se levantar do sofá?

Júlio Verne nasceu em Nantes em 1815 e faleceu em Amiens em 24-03-1905.


Boa sexta-feira, com muitas leituras…


Luís Monteiro da Cunha

23 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Posse...

Lentamente banho os pés
na areia beijada de salinidade
sinto percorrer-me o corpo
uma sensação prazenteira
que me preenche de maresia
escuto os breves mas persistentes sussurros
com que adormeces os meus anseios
deixo-me embalar nesse canto perene e melodioso
Por momentos esqueço-me do mundo
das nuvens e das aves que volteiam
das rochas que me ferem
da areia que me acoita
e sós ficamos,
eu e tu
numa dança consentida
de abraço e fugida
de retorno e recuo…
tu não és só meu
porque eu não te possuo
mas tu
possuis-me a mim!

Não é justo!



© Luís Monteiro da Cunha

22 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Jogo da vida

foto: Bufagato


Reflectido no reflexo
Das águas absortas
Recordo imagens paradas
No tempo ausente
Chegam-me disformes
Como as ondas deste lago
Também parado do vento
Pardas e baças são
Perderam o brilho
Quiçá a esperança
Mas não morrem
Nem definham
Porque existem ainda
Neste pensamento
No jogo de cabra cega
Quem sairá vencedor
Se não existem vencidos
Neste jogo de lamentos
Sem raiva apenas dor
Perde-se por ausência


© Luís Monteiro da Cunha

19 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Pura Dádiva

Esperança

Para ti... Pai!




Inopinadas nuvens conjugam-se na abóbada celeste
da cópula consumada no conciso momento, afastam-se
no porvir de que jamais se cruzarão no seu cursar sobranceiro

Permanece a sua dádiva na configuração de gotículas
imaculadas de cristalinidade dos titubeantes raios de Febo que
as macula de espectros transmutados na paleta desta manhã primaveril

Continuarão virginais no seu ligeiro e lacónico destino
Aguardo que entendam a face do meu ser humano



© Luís Monteiro da Cunha

14 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Sem caminhar!

Cidade da Maia, nascer do dia



Arrasto o passo no pé preso
Tão longínquo o horizonte que persigo
Perto demais o destino que carrego

Arrasto o pé no passo preso
Inebriado no horizonte que desdigo
Enorme este destino que me ofereço

Flutuam meus pés presos
Nas brumas indeléveis do axioma
Inquestionável este tender que sonha
Emanando alvo de meus dedos

© Luís Monteiro da Cunha

13 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Foi uma vez...



Foi uma vez…


O relógio emitiu o som estridente, irritante até! Era a sua função e para isso estava pré-programado.
Vasco Fernandes, a contra gosto tacteou o botão para o desligar, olhando-o de relance.
Ainda era madrugada.
Apetecia-lhe continuar mergulhado no vale de lençóis… tão quentinho estava. Mas as obrigações logo se sobrepuseram na sua mente, obrigando-o a esquematizar mentalmente o trabalho deste dia que se aproximava.
«A vida não se compadece dos preguiçosos». Lembrou a sua máxima.
De um pulo, saltou da cama, sentindo o tapete frio nas plantas dos pés que tacteavam os chinelos desalinhados e adormecidos sob o leito.
Tiritou. O quarto estava gelado. Nem a mobília nova, acabada de estrear dias antes, o aquecia, nem os homens do aquecimento se dignavam aparecer para o ligar apesar dos contactos e reclamações que fez junto do construtor nesse sentido.
Ainda não tivera tempo ou oportunidade de mobilar devidamente a casa, também esta recentemente adquirida. Apenas comprara a mobília do quarto e quando se passeava da cozinha para este os seus passos ecoavam nas paredes cavernosas e nuas. Mas era sua e seria o seu ninho por muito tempo, estava convicto. Até porque ultimamente, esta compra fora a única alegria verdadeira e deveras sonhada que tivera nos últimos anos na sua vida e que conseguira concretizar.
Seguindo o conselho de amigos do ramo bancário, resolveu-se a comprar uma casa, deixando de alugar apartamentos, atrás de apartamentos. Fora um risco calculado. Aproveitou a conjuntura financeira do país, que atravessava uma fase mais desafogada com os juros bancários em baixa, como fizeram tantos neste país nos últimos anos.
Vestiu o roupão, aconchegando-se nele e dirigiu-se à casa de banho. Levantou o tampo da sanita, desapertou o roupão, baixou a frente das calças do pijama riscado, e… começou a viver um novo dia.

© Luís Monteiro Cunha

11 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Embriago-me de ti, mulher!





Uso o teu perfume...
Morre-me a saudade
Uso o teu sorriso
Lembra-me o sol nascente
Uso o teu olhar
Firmado nos meus olhos
Tão abrangente
Uso o teu som
Para não ensurdecer
Uso as tuas mãos
Para te agradar, mulher
Uso os teus seios
Para adormecer
Uso a tua alma
Para conseguir viver...
Como dói a ausência,
De te usar e ter…
Uso a dor de não te esquecer

Uso o aroma
De teu corpo
Para por ti
Morrer, absorto
Neste poema
Que não escrevi


© Luís Monteiro

Luís Monteiro da Cunha

Abandonas-me ao esquecimento...

Porque um blog não sente




Recordas-te... Alex?

Bufagato

09 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Em Nuvens

Tela: Lis Pereira



Em nuvens


Não gastes as palavras
Se podes apenas pensar
Todo o mundo será teu
Em pensamento tu abres
O sonho de todo o céu
Escreve apenas nas nuvens
Com tinta de trovoadas
Do arco-íris retira os tons
E faz de cada manhã
Uma mensagem acordada



© Luís Monteiro da Cunha

Luís Monteiro da Cunha

Sacrossanto, eu?!

imagem: M. daCunha


Quanta miséria!
Tanta raiva e rancor!
E da xenofobia que dizer!?
Que pena tenho de não poder, ter o simples poder de moderar e moldar as mentalidades.
Incutir amor e benevolência, respeito pelo semelhante e suas ideias, mesmo que estas sejam antagónicas e contra a minha própria ideologia.
Mas não sou sacrossanto, nem a tal me quero arvorar.
Como dói ouvir-vos falar, tão convictos nas palavras proferidas que de tão veementes, apesar de pusilânimes, quase parecem absolutas.
Reparo no entanto, que pouco evoluíram se comparadas aos escritos inflamados da história que na sua jactância, chacinaram milhões de semelhantes.
Custa assim tanto, ser ouvinte perspicaz de palavras perceptíveis quanto baste, para aprender diariamente e sempre, discutindo-as moderadamente, sem tentarem subjugar as ideias de outrem?!

© Luís Monteiro da Cunha

Peço desculpa a todos aqueles que leram este texto e a quem induzi em erro com a grafia utilizada e a respectiva arquitectura gráfica, que utilizei apenas para realçar as palavras e o objectivo das mesmas, tratando-se apenas de um texto de opinião e nada mais que isso.
Não é prosa poética nem sequer poesia, pois não o trabalhei como tal, nem foi esse o objectivo.
As minhas sinceras desculpas pelo meu erro.
Luís Cunha

08 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Para ti MULHER...




Para ti MULHER,
irmã, mãe, esposa, avó...
Que apesar de rodeada de mundo,
sentes-te tão só...

Beijo-te as mãos e dou-te o meu coração
de amor, filho, neto, pai, irmão!


Bufagato

07 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Sentinela de Luz!




Madrugada em silêncio
Esfuma-se devagarinho
A nicotina desta vida
Numa janela perdida
Escondido, tão sozinho

Sobranceiro, abarco tudo
E tudo o que vejo… é meu!
Tudo me pertence neste mundo
E este mundo, sou eu
O mundo, mudo!


Porque eu sou tudo
Tão abrangente que sou
Sou também, o bem e o mal
A raiva e o despudor
O frémito, o vómito
Este luar, o ar e a dor…
O prazer parental
Sou eu, e apenas sou…
O mundo, mudo!

O fecundado no ventre
O aborto que gesticula
No comício, sou eu…
A raiva da esposa,
O ébrio que vocifera… pois sou!
O beijo de lascívia… é meu!
O abraço saudoso, também!

E tudo o que pensas pensar
Não penses…
Eu penso por ti
Porque tu és eu!
E em ti eu me revejo
Acordado a divagar!
Vigilante da noite
De teu breve sonhar!

Sou filho da Luz
E esta vive em tudo,
Por isso tudo é meu!
E tudo… sou eu!
Mudo, neste mundo, meu!

© Luís Monteiro da Cunha

06 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Praia dos Beijinhos

imagem: Bufagato
Praia dos Beijinhos



O Sol límpido e quente, abraça-me e tolhe-me os sentidos, deixando-me lento, até pachorrento. Tão gostoso este sol.
Junto às praias, estaciono o veículo, resolvido a encontrar um local aprazível que me possa proteger do vento agreste e onde me possa deleitar com o que prevejo, será um magnífico pôr-do-sol.
Estou na Praia dos Beijinhos, na marginal de Leça da Palmeira.
Sento-me numa das várias esplanadas ali existentes, encostado ao enorme vidro com vista directa para a minha sedução: o mar e a praia.
A sala/esplanada, está a abarrotar de pseudo-estudantes. Jovens imberbes, rapazes e raparigas que carregam uma carrada de livros que nem sequer abrem, preferindo poluir o ambiente com as graçolas e as risadas entre si. Seria bonito o ambiente de sorrisos e alegria, não fosse o facto de se tornarem desagradáveis os gritinhos e quase berros com que presenteavam os clientes.
Após cerca de vinte minutos, sem que alguém se dignasse sequer perguntar o que desejava tomar, eu que até estava com sede, resolvi levantar ferros e deambular até outras bandas mais serenas mas com vista para o meu amado mar.
Se melhor o pensei, melhor o fiz.
Não precisei andar muito. Atravessei a marginal, pois imaginei que as esplanadas de praia seguintes estariam também pejadas de estudantes e entrei no primeiro bufete que encontrei defronte para a praia, o mar e o sol, como era meu desejo.
Ainda mal estava sentado, fui recebido com um enorme sorriso, descobri depois que era a proprietária, de boas vindas e desejos de boa tarde.
Indolentemente, saboreei uma geladinha, apesar do vento frio o mar secara-me a garganta, enquanto o meu séquito tomava um sumo de manga e gelados de chocolate Pallina que adoraram.
Era pequeno o lugar, apenas tinha sete mesas e o balcão para os clientes.
Na coluna central forrada a madeira e com uma prateleira a toda a volta, reparo em livros gastos, dezenas, senão centenas de vezes folheados, com aspecto abandonado. Esta visão suscita-me várias questões. Seriam livros esquecidos dos clientes, ou fariam parte do espólio caseiro e para agradar aos mesmos clientes? Quem os lia? A patroa? A empregada… não, esta era jovem e não me parecia muito dada a este tipo de leituras, talvez folheasse sim, mas apenas revistas que para aí existem e que estão na moda.
Apeteceu-me agarrar num dos livros espalhados na estante improvisada e descobrir o âmago de pelo menos um deles, até porque não me tinha feito acompanhar dos meus. Mas inibi-me de o fazer. Primeiro, porque não sabia de quem eram, se da casa se dos clientes que possivelmente ali os deixavam por serem clientes habituais… formou-se-me uma ânsia na boca do estômago. Forcei-me a olhar para outro lado e assim me abstrair daquela presença tão apelativa. Depois existia também a curiosidade natural de saber o tipo de leitura, embora pelos formatos, adivinhava livros de bolso e os outros… esses é que me chamavam, num apelo persistente, como gostaria de os folhear e descobrir o que teriam para me dizer das suas histórias, nem que fosse apenas umas quantas páginas, descobriria imediatamente o seu ser, o que versavam, de que massa foram feitos.
No local, além da patroa e da empregada, apenas mais duas mesas estavam ocupadas. Na outra ponta do estabelecimento, um homem já entradote, folheava indolentemente um jornal diário, todo recostado para trás na cadeira quase não deixava ver o rosto. Como eu, recebia na fronte os beijos solares que nos aqueciam o corpo e nos tornavam mais indolentes ainda.
Perto da porta de entrada, numa mesa perto de nós, duas figuras femininas falavam em surdina. Uma delas teria cerca de dezoito anos, a outra era mais velha, rondava os trinta e estava sentada ligeiramente de costas para nós.
Passeei os meus olhos pelo bufete e por fim fiquei absorto na água do mar espelhado que me feria os olhos.
O sol, despedia-se deste lado do mundo, ladeado por dois navios que aguardavam ordem de atracagem no porto de Leixões. Entre eles se iria deitar o sol.
Estava nesta contemplação, quando sinto… não uma, nem duas, mas várias vezes senti, que éramos olhados à socapa. Logo me apercebi da fonte desses olhares. Também ela se apercebeu que eu me tinha já apercebido das mensagens subliminares:
“Quem és?” “Olha para mim” “Como te chamas” “Vem até aqui” “Senta-te na minha mesa” “Quero conhecer-te”!
Olhei-a directamente nos olhos, obrigando-a a disfarçar. Sem que se apercebesse e baixinho disse ao meu filho de quinze anos que ela estava interessada nele. Claro que ele desdenhou, é tímido, e até negou, mandando-me calar… mas a verdade é que apesar de se fazer de desinteressado, surpreendi um sorriso calado na direcção da mesa dela… claro que a partir desse instante, as mensagens visuais e subliminares eram mais que muitas, mas eu sabia que não passariam disso. Conheço o meu rebento e na sua timidez, sai ao pai, nunca teria coragem de se levantar. Talvez daqui a mais uns anitos, quando já for mais seguro de si e da sua beleza imberbe…
Quando o sol já se deitara, paguei, saímos e então reparei numa enorme tabuleta que me passara despercebida até então:
“PRAIA DOS BEIJINHOS”
Compreendi então que ali, na “Praia dos Beijinhos”, tudo pode acontecer e o mais provável é acontecerem muitas aventuras, até… beijinhos!

Boa semana para todos.

© Luís Monteiro da Cunha

04 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Duvidando

foto: Bufagato
Pintura de: Lis Pereira
Exposição no Rota da SedeArt’Caffé


Porque duvidas
Das minhas dúvidas
Na certeza que tens
De que as minhas
Incertas palavras
Não passam de imperfeita
Ocupação definida
Na indefinição perfeita
Da minha incrédula mente

Não duvides
Alma (in)crédula
Acorda os teus sentires
Terás nesse exercitar
A visão do quanto poderias ser



© Luís Monteiro Cunha


03 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Da Criação…




Estupidez absoluta
A argúcia não é o seu forte
Dizem-se Criadores
Quais Deuses, que do pó constroem palácios
Das maresias, tempestades tumultuosas
De sonhos, fazem vocábulos
Por suas certezas, criam definições, indefinidas
Porque sempre existe a retórica
E esta é metódica

Como se podem arvorar a tanto
Se nada Criam de novo
Senão a aglutinação de contextos

Simples cozinheiros aprendizes
Com esperança de pasteleiros
Com as mãos, distorcem, amassam
(Sem que moam os grãos até à infinitésima parte do finito)
Não discorrem o sumo e a seiva
Cada dor, abstracção, pensamento, ou simples lamento
De amor alegre e benfazejo, a permuta num beijo
Gizar pleno e constante, permutável e persistente
De cada desejo que fortemente bate no peito

Que dizes

Quem Cria o quê afinal
Se tudo o que estudas e se conhece
Está já inventado desde que o mundo é mundo

Que pena
Mas, não sei criar
Nem sou cozinheiro ou pasteleiro
Talvez
Mal cozinhado
A queimar
Que cheiro


© Luís Monteiro da Cunha

01 março 2006

Luís Monteiro da Cunha

Ensurdecido!



Tentei!
E como eu tentei…
Escutar-te no silêncio
Da nossa sinfonia!
Mas os graves
Eram agudos
Os agudos
Eram esdrúxulos
Os pífaros
Feriam-me os olhos
Inundados de violetas,
Azuis
Como castanho-esverdeado,
(Que são,)
Extravasaram
De neve…
Negra!
Numa percussão exigente
Persistente
Ritmada e abrangente!
Ensurdeci
De ti
Para ti!
Esfumaram-se
Os espelhos de minh’alma
Os céus; as nuvens multicoloridas
O sol; as estrelas; os ventos.
Foram-se!
Partiram!
Eu fiquei!

Já te ouço, …
No teu surdo gemer
Vejo-te, soçobrada
Sem que me possas
Contudo, rever...


© Luís Monteiro da Cunha

Luís Monteiro da Cunha

Realidades




Porque sonham
As palavras

Se estas...
Não vivem as realidades!



© Luís Monteiro da Cunha

Luís Monteiro da Cunha

Porque somos humanos...

e porque a solidariedade, não é ainda uma palavra gasta...
Alguém precisa de ti...
Não deixes de visitar e deixar um pouco de ti...
Boa semana serena e plena de anseios!