Escrito em tempos: "Orvalhadas"
A minha mãe, aproxima-se de mim com um sorriso malandro nos lábios e os olhos trocistas:
- Reconheces isto?
E tira do bolso do avental, uma folha de papel A4 dobrado em quatro, que me oferece de seguida.
Curioso, agarro no papel, desdobro-o lentamente e estupefacto, começo a ler:
“ORVALHADAS”
Hoje, ouvi alguém a cantar as «orvalhadas».
Escutei com atenção, pois a palavra, apesar de não ser comum, não me era totalmente desconhecida.
Era uma canção sanjoanina, muito em voga na cidade do Porto, no norte do país, a qual se ouve muito nesta época do ano, quando se procuram nas prateleiras cheias de pó, as canções que fizeram furor no passado saudoso.
Mas, o que me chamou a atenção, foi a palavra em si e não a fonética ou o acompanhamento musical, que apesar de agradável, pode-se considerar comum.
Como pensei…
Orvalhada, substantivo feminino e quer dizer: orvalho da manhã; queda ou formação do orvalho.
E o que é o orvalho? Consultado o dicionário… cá está…
Orvalho, substantivo masculino; vapor de água que se condensa em forma de pequenas gotas, devido a um arrefecimento lento do ar, e se deposita de manhã e à noite, sobre os corpos expostos ao ar livre; chuva muito miúda;
Porque é que foi usada na canção que escutei?
Como acima exposto, trata-se de humidade no ar, a qual, como é costume na noite de S. João, não falta, para dar um arrefecimento nas almas turvas e escaldadas com o calor da noite, acompanhada de muito vinho ou outras bebidas etílicas e, das sempre boas e quentes sardinhas assadas.
Quem ainda não passou uma noite ao relento, na companhia de amigos e sentiu nas costas o «orvalho», ou seja… as roupas humedecidas pela humidade existente no ar e que se vai acumulando em tudo o que toca… e especialmente nas pessoas, só se nota quando se está parado e o corpo já não consegue evaporar a humidade que se acumula na roupa que o reveste.
Tenho saudades das orvalhadas, dos meus tempos de garraio, em que nada se sentia no corpo, que tudo aguentava, quantas noites de folguedos e namoricos ao som de canções populares… como as «Orvalhadas».
Luís Monteiro da Cunha
Domingo, 22 de Junho de 1997"
Este é o conteudo do mesmo, conforme o escrevi e como a alma o ditou naquele tempo, sem qualquer pretensão de escrito publicável.
Obrigada minha mãe, por esta surpresa...
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